Imagine viver em um país onde para escrever um artigo como esse que você está lendo, o autor precisa pensar uma, duas, três vezes ou mais para ter certeza de que está disposto a correr o risco de ser censurado, intimado, punido ou até mesmo preso por simplesmente expressar o seu pensamento? Esse é o Brasil de hoje.

O sentimento de intimidação que muitos de nós, agora, sentimos ao expressar o que pensamos, é o resultado direto do que, segundo palavras do renomado J. R. Guzzo em sua coluna na Gazeta do Povo, constitui o “novo regime” que vem sendo instalado no país, onde divergir, criticar e ir de encontro a um discurso dominante significa abrir caminho para a autoincriminação.

Isso só se tornou possível graças a um conjunto de fatores, sendo ele de ordem midiática, política e judicial, o que chamaremos daqui em diante de aparato midiático-político-judicial. Trata-se, portanto, de uma tríade que opera de mãos dadas, consolidando esta que também já podemos chamar de “ditadura à brasileira”.

A narrativa

Tudo começa pela criação de uma narrativa, e isso surge através dos meios de comunicação. É a velha mídia que perdeu espaço com a propagação de veículos independentes nos últimos anos, graças ao avanço da internet.

Uma vez criada a narrativa, ela passa a ser utilizada no meio político como ferramenta de ataque contra os adversários. Exemplos de narrativas são os conceitos de “fake news”, “desinformação”, “ambiente desinformacional”, “discurso de ódio” e “atos antidemocráticos”.

É importante frisar que a narrativa, por si só, não é danosa, pois ela tem o seu valor, uma vez que notícias falsas, desinformação, ódio e ímpetos autoritários são realidades. O problema está no uso manipulado delas com intenções maliciosas, cujo objetivo é enquadrar o contraditório de forma indiscriminada. É isso o que tem ocorrido.

Outro exemplo de narrativa é o uso do termo “bolsonarismo”. Com o passar do tempo, todo apoiador do ex-presidente Jair Bolsonaro se tornou um “bolsonarista” que, agora, é praticamente sinônimo de “fascista” e até de “terrorista”. Nada disso ocorreu de forma despropositada.

A política

Uma vez criada a narrativa, ela é usada no ambiente político como instrumento de ataque aos adversários. Nessa fase, o lugar em que o debate público deveria ser livre e  respeitoso, torna-se nocivo, intolerante e agressivo, com um lado utilizando os rótulos discriminatórios para enquadrar seus inimigos.

A esquerda tem feito isso constantemente, e com maestria, pois ela tem em suas mãos grande parte dos veículos de comunicação. Isto é, quem faz parte dele. Logo, uma vez que o rótulo é aplicado ao adversário político, ele já soa com peso de sentença. A pecha, uma vez imposta, dificilmente é dissolvida.

O judiciário

Com a narrativa em mãos e os alvos definidos, a esquerda recorre ao judiciário para fazer valer as suas intenções. Esta é, na prática, a fase mais grave, covarde e cruel da ditadura à brasileira, pois não requer parâmetros definidos em lei para prevalecer.

É o que temos visto através da censura aos perfis conservadores nas redes sociais. Tudo que é rotulado como “desinformação” ou incitação de ataques contra a democracia passou a ser enquadrado pelo estado policialesco em que nos encontramos, culminando em bloqueios de contas, busca e apreensão, entre outras medidas.

Como podemos notar, portanto, a tríade do aparato midiático-político-judicial opera em sequência e em harmonia, criando o ambiente de perseguição vivenciado hoje no país.

A quem recorrer?

Diferentemente de outros regimes ditatoriais, a ditadura à brasileira nasce com o potencial de ser uma das mais, senão a mais repressiva do mundo. Isso, porque, até em países como China, Cuba, Venezuela, Coreia do Norte ou Nicarágua, alguma instância da sociedade promove resistência.

Nesses casos, o exemplo mais comum é vermos a resistência por parte da imprensa local, que insiste em noticiar os abusos do regime. Em outros, vemos juízes e pessoas ligadas aos direitos humanos, em geral, defendendo a liberdade civil. E no Brasil?

No Brasil, como vimos antes, a imprensa anda de mãos dadas com os políticos autoritários e a parcela do judiciário ativista, o que nos leva a crer que isto só é possível devido à corrupção sistêmica que ainda existe. Ou seja, todos possuem, de alguma forma, algum nível de interesse na manutenção de um Estado ditador.

Talvez, repasses de verbas públicas, contratos ilícitos, causas compradas, o narcotráfico, etc. As possibilidades são muitas! Diferentemente de outros regimes, portanto, a ditadura à brasileira não tem deixado escolhas para a população, que cada vez mais se sente refém de um sistema poderoso e covarde.

Aparências enganam

O leitor menos familiarizado com o estudo de regimes políticos pode achar que é um exagero falar de “ditadura” no Brasil. Ora, se você tiver a oportunidade de perguntar diretamente a um norte-coreano se ele vive numa ditadura, a resposta muito provavelmente será “não”.

Grande parte dos norte-coreanos acreditam, até hoje, que vive em guerra contra os Estados Unidos, e que por causa disso o regime político do seu país é justificável. Essa noção é fruto de décadas de alienação ideológica baseada em propaganda e controle estatais.

Nenhuma ditadura tem início de um dia para o outro. Elas começam sob falsas justificativas, implementando medidas que aos poucos vão suprimindo direitos básicos da sociedade sob a alegação de proteção, por exemplo, da “democracia”.

Quando, no Brasil, um deputado federal tem o direito de expressar a sua opinião livremente censurado, este é um sinal gritante de ditadura em curso. Hoje, não apenas cidadãos comuns, mas grandes empresários, jornalistas e parlamentares estão proibidos de “falar” o que pensam, e tudo com base em decisões que não têm o amparo de tipificação penal, mas tiveram o “aval” da mídia.

A liberdade de expressão não é absoluta, dizem os censores, o que é verdade. Porém, o limite da liberdade de expressão é o limite da Lei. Os crimes de injúria, calúnia e ofensa, só podem ser julgados quando a pessoa que os comete tem a liberdade de cometê-los, o que significa poder se expressar.

Nesses casos, a liberdade de expressão esbarra nos limites da Lei que tipifica como crime caluniar, ofender e injuriar. A mesma coisa vale para quem incita a violência, à pratica ou atenta contra o livre funcionamento das instituições democráticas. Para todos esses casos existe tipificação penal no Brasil.

Agora onde está, no Código Penal, a tipificação penal para a “desinformação”? O “discurso de ódio” ou para quem questiona o sistema eleitoral? Desconheço existir, e se a Lei determina que não há crime sem lei anterior que o defina, consequentemente toda decisão que pune cidadãos sem previsão legal é abusiva e ditatorial.

Conclusão

A ditadura à brasileira vem escalando de forma agressiva. Opiniões como a desse artigo já não são mais publicadas em um clima de liberdade, pois o questionamento, principalmente a crítica ao “sistema”, tornaram-se alvos da patrulha político-ideológica que detém o controle do poder e dos meios de comunicação.

Viver em um país onde a sensação de que podemos ser o próximo alvo do regime é uma realidade constante, a ponto de não sabermos mais, exatamente, o que podemos ou não dizer, demonstra claramente que a fase ideológica de implantação da ditadura já foi consolidada.

Onde vamos parar? Difícil dizer, mas uma vez iniciado o processo ditatorial, a tendência é piorar, pois quanto mais expusermos os seus autores, mais eles usarão a força para tentar nos calar. Caberá ao povo brasileiro a responsabilidade de reaver a sua liberdade, antes que seja tarde demais.