Desde janeiro desse ano, quando o presidente Jair Bolsonaro assumiu o seu mandato após uma eleição extremamente conturbada, grupos de interesse na política nacional que antes pareciam unidos se tornaram rivais ou, no mínimo, divergentes. O governo passou a ter que lidar com conflitos entre aliados, uma realidade que vem se acentuando dramaticamente nos últimos dias. Mas, por qual motivo?

Alguns dizem que agora “máscaras estão caindo” e os farsantes estariam sendo expostos, enquanto os verdadeiros direitistas resistem aos ataques cada vez mais intensos da oposição. É verdade que muitos surfaram na “onda conservadora” nas eleições de 2018, tendo a figura de Jair Bolsonaro como principal cabo eleitoral.

Pessoas como o ex-ator pornô Alexandre Frota seria um desses exemplos. Para alguns, o governador de São Paulo, João Dória, e os meninos do Movimento Brasil Livre (MBL), seriam outros. O fato é que, na verdade, é um erro afirmar que no Brasil até 2018 já haviam grupos de direita consolidados, razão pela qual é prematuro dizer que “máscaras estão caindo”.

O Brasil foi alicerçado em uma cultura política de esquerda e ela atravessou o regime militar. Uma vez inoculada nas veias da nação, a ideologia esquerdista tomou conta de todo o sistema público e, principalmente, se tornou o meio de raciocínio da população.

A lógica paternalista, típica dos estados socialistas, determinou o rumo das iniciativas governamentais, sendo praticamente impossível desvincular a ação do Estado do viés assistencialista que transformou os pobres em uma grande massa de manobra política-eleitoral.

O embrião da direita

No Brasil nunca tivermos uma direita, de fato. Ideais e valores de direita, sim, mas não grupos de direita consolidados, nem partidos. A esquerda sempre foi hegemônica, ainda que velada, algumas vezes mais para o centro. A bancada evangélica ganhou força nos últimos anos, mas não o suficiente para representar a direita no país em nível nacional.

Só após a iminência de um colapso econômico monumental em decorrência dos erros da era petista, entre 2014 e 2016, os defensores dos ideais de direita começaram a se organizar, e boa parte disso graças ao poderio da internet.

Foi nesse período de “levante” nas ruas e na internet que muitos aderiram à onda de mudança no país. O liberalismo econômico se uniu aos ideais conservadores, formando uma força única necessária para lutar em um contexto de caos cultural (moral) e financeiro.

A organização política de direita surgiu como um embrião através do apelo popular por mudanças. Retornamos ao século XIX, época em que os “notáveis” podiam se eleger, independentemente de partidos. No Brasil, ainda que candidaturas avulsas não sejam permitidas, os notáveis virtuais – podemos chamar assim – assumiram a figura da direita embrionária, sendo Jair Bolsonaro o nome de maior projeção.

Muitos outros, como João Amoêdo, do partido NOVO, são defensores de pautas economicamente liberais, associadas à direita, mas não dos valores conservadores inerentes à identidade da direita clássica. Luciano Huck, virtual candidato à presidência em 2022, é outro exemplo de falso direitista. Liberal economicamente, até a China é, mas nem por isso deixa de ser controlada com punhos de ferro pelo comunismo.

Os membros do MBL são outra grande farsa em potencial no tocante à direita clássica, onde a pauta moral e econômica andam de mãos dadas. Não por acaso o candidato inicialmente apoiado por eles em 2018 foi João Amoêdo, só depois que Dória resolveu abandonar o pleito presidencial para fazer “estágio” no governo de São Paulo.

Bolsonaro, para o MBL, foi a última bala contra o PT. A escada de acesso a maior popularidade e organização para futuros investimentos, como a oficialização da sigla em partido político, entre outros. Entretanto, está presente no DNA dos meninos a tendência de se inclinar à esquerda no âmbito moral, e isso já vem acontecendo através de certos “diálogos”. MBL, Dória, Amoêdo e Huck, portanto, estão mais para a “esquerda fabiana” do que para a direita.

A grande ameaça

Diante de tal cenário o que sobra, afinal, para chamar de verdadeira direita? Ainda não é possível definir um grupo de direita organizada no Brasil, e nem partido. É possível definir alguns “notáveis”, como o próprio presidente da República, mas é preciso um trabalho minucioso para classificar com segurança quais se encaixam nos preceitos clássicos da direita.

A verdade é que a maioria do público é guiado pelo posicionamento em grandes pautas, tais como a legalização das drogas, aborto, liberdade religiosa, educação familiar e porte de armas. Isso resume para muitos o que parece ser ou não de direita, o que não deixa de ser verdade, mas não é só isso.

A grande ameaça ao atual governo é a própria “direita”, exatamente porque no auge das eleições do ano passado muitas pessoas foram eleitas por conveniência. São pessoas como o Alexandre Frota, que viram na onda conservadora como grande propulsora da luta contra o petismo a chance de se autopromover.

Por essa razão, há entre os aliados muitos “frotas” disfarçados apenas esperando uma nova chance de se beneficiar, e é ai onde entram as alianças espúrias (note que Frota e Dória se tornaram aliados, não por acaso) capazes de derrubar o governo antes mesmo do fim do seu mandato.

Como se tudo isso não bastasse, há também a falta de sabedoria entre os verdadeiros apoiadores, que ao invés de lavar a roupa suja em secreto, atualmente usam a internet como campo de batalha. Falta de bom senso entre aliados, ansiedade por mudanças que exigem anos de trabalho, interesses pessoais, imaturidade emocional e muitos “frotas” constituem a grande ameaça ao governo Bolsonaro.

É possível que de tudo isso saia um grupo de direita consolidado? Sim! Os conflitos servem também como uma peneira para separar o joio do trigo. Mas é possível também que por falta de experiência, imaturidade e interesses conflitantes, esse embrião da direita que hoje está no poder não se desenvolva, e se isso acontecer a esquerda certamente virá mais forte do que nunca para engoli-lo.