O embaixador da China no Brasil, Yang Wanming, fez uma publicação neste domingo (18) que chamou atenção pelo tom religioso. Ele escreveu o seguinte: “Quem é Deus? O Povo é Deus, é o povo que faz a história e determina a história”. O texto foi acompanhado de uma imagem com dizeres supostamente em mandarim.

Questionado por uma seguidora se o texto seria uma tradução dos dizeres na imagem, o embaixador respondeu, sem maiores detalhes: “Viva o povo. Caligrafia de Mao Zedong”. Ou seja, Yang deu a entender que a sua postagem foi uma citação em referência ao ditador comunista chinês que viveu entre 1893 e 1976, considerado o fundador da República Popular da China.

Aqui, portanto, temos duas coisas que nos chamam atenção: primeiro, a postagem do embaixador comunista ocorre em um dia tradicionalmente associado à fé cristã, quando a população realiza por todo país cultos e missas – o domingo.

O dia da postagem e o fato da legenda ter sido em português nos faz parecer que a intenção foi, realmente, se dirigir ao povo brasileiro, mas em tom de provocação, pois ele sabe que para a fé cristã Deus é um Ser real, criador da vida e de tudo o que há no universo, e não uma ideia abstrata e impessoal.

Diferentemente do que alguns podem alegar, a postagem também não é uma referência à percepção de fé sobre Deus do povo asiático ou dos chineses em geral. Isso porque, primeiramente, o Partido Comunista da China é declaradamente ateu. O regime chinês não admite crença em qualquer divindade ou sistemas religiosos.

Além disso, o número de cristãos na China é maior do que o de muitos países. Segundo a organização Portas Abertas, existem no país atualmente cerca de 96,7 milhões de cristãos chineses, o que derruba por completo qualquer argumento de que a visão do povo asiático é anticristã.

Segundo, a citação do ditador Mao Zedong como referência para a postagem é o que parece explicar a natureza da mensagem. Isso porque, Mao foi responsável pela implementação do chamado “culto à personalidade” na China. É por isso que o embaixador diz que o “povo” é Deus, porque para o regime comunista chinês o líder máximo do país é a representação do povo. Ou seja, é como dizer que Xi Jinping é Deus!

Isso fica claro quando entendemos o pensamento de Mao. Em 1964, por exemplo, ele publicou o “Livro Vermelho”, instrumento usado pelo Partido Comunista para implementar o culto à figura do ditador.

“O livro, em formato de bolso, foi um instrumento eficaz no desenvolvimento do culto à personalidade de Mao”, diz o UOL Educação. “Utilizado para a doutrinação ideológica das massas, reafirmava a ideia de que o maoísmo era a culminação do pensamento marxista-leninista. Durante esse período, citações do livro eram exigidas inclusive em trabalhos científicos e sua leitura realizada, diariamente, nas escolas e nos locais de trabalho”.

Quando Yang Wanming diz que o povo é Deus, portanto, ele está falando da visão comunista do seu partido e não de fé. É devoção ideológica e não religião. E como se não bastasse fazer isso direcionando a sua mensagem ao povo de um país de maioria cristã, ele ainda fez referência a Mao, um genocida reconhecido pela história.

Foi Mao o responsável pela criação de grupos armados de estudantes que perseguiram intelectuais, professores e antigos membros do PC, o que acabou resultando num banho de sangue cujas mortes ainda não podem ser calculadas, dado o fato de a ditadura comunista chinesa continuar impedindo as investigações.

Foi sob o governo de Mao, também, que entre 1958 e 1962 foi implementado o “Grande Salto Adiante”, uma reformulação econômica que pretendia transformar a China em uma potência industrial, mas que acabou resultando em um colapso que levou pelo menos 40 milhões de pessoas a morrer de fome.

Portanto, independentemente da postagem ter sido provocativa ou não, o fato é que ela contraria a fé cristã em essência, exalta a ideologia comunista e louva a figura de um ditador responsável pela morte de milhões de pessoas na China.