Em primeiro lugar, é importante deixar claro que os indivíduos mencionados neste artigo fazem questão de serem reconhecidos como bichas. Portanto seria muita desonestidade intelectual alguém sugerir que o título deste texto sugere alguma forma de “preconceito”, “discriminação” ou “homofobia”.

O Dr. Luiz Mott, por exemplo, embora seja antropólogo, decano do Movimento Homossexual no Brasil e fundador do Grupo Gay da Bahia (GGB), orgulha-se de haver conquistado há décadas a alcunha de “Bicha-Mor da Bahia.”

O ex-BBB Jean Wyllys, por sua vez, ao ser chamado de “bicha” durante uma audiência pública, por um indivíduo da plateia, fez a seguinte correção: “Bicha, não. Dona Bicha.

Isto posto, passemos agora a examinar a divergência de opiniões entre essas duas bichas acerca da questão da possibilidade de mudança da orientação sexual e quanto à existência de ex-gays.

A Dona Bicha começou sua militância na causa LGBT durante os anos em que ela cursava jornalismo na Universidade Federal da Bahia (UFBA), na capital baiana. Em Salvador, a Dona Bicha conheceu a Bicha-Mor e ingressou nas fileiras do GGB.

À boca miúda, a Bicha-Mor afirma que a Dona Bicha se interessou por ela que, à época, estava namorando outro alguém. Mas, isso já é outra história. O que nos interessa neste texto é demonstrar que, embora tenha sido doutrinada segundo os pressupostos ideológicos do GGB, a Dona Bicha parece haver se voltado contra os ensinamentos de sua mestra, a Bicha-Mor. Em 2017, a Dona Bicha fez uma afirmação que expôs a Bicha-Mor ao ridículo:

“Nenhum cientista de nenhum lugar do mundo diz que a homossexualidade ou a heterossexualidade possam ou devam ser ‘curadas’ ou ‘revertidas’. Isso é uma burrice, uma loucura.”

A Bicha-Mor, por sua vez, havia afirmado em 2003 e reafirmado, em 2015, que existem, sim, ex-gays:

Como Marta Suplicy, defendo que a orientação sexual de pessoas não 100% gays pode, sim, dialeticamente, se concentrar em outros objetos erótico/afetivos. Como eu, que vivi como heterossexual/bissexual até os 31 anos, casado e com filhas, e somente então defini-me exclusivamente e essencialmente gay.

É interessante que a Bicha-Mor tenha mencionado a ex-senadora Marta Suplicy. Afinal, Suplicy, além de psicóloga e sexóloga, é aliada histórica do Movimento Gay no Brasil e tem publicado vários livros e artigos científicos nos quais aborda a questão homossexual.

Há décadas, Suplicy vem destacando que a homossexualidade não é um caminho sem volta. Em seu livro Sexo para Adolescentes, por exemplo, à página 114, ela afirma que os homossexuais podem se tornar heterossexuais, se forem ajudados com tratamento psicológico.

Suplicy sugere que a mudança de orientação sexual pode ser ainda mais facilmente conquistada se a ajuda psicoterapêutica for iniciada precocemente, “antes de a preferência sexual estar firmemente estabelecida”.

Ao que parece, de acordo com as pesquisas e a experiência clínica de Suplicy e segundo a experiência de vida da Bicha-Mor, podemos acreditar que até por volta dos 30 anos a psicoterapia pode ajudar os homossexuais que, segundo Suplicy, gostariam de ser heterossexuais.

Alguém poderia argumentar que apenas um caso isolado ou até mesmo os estudos e a experiência de Suplicy não servem para refutar a opinião de uma ativista LGBT com o “estofo intelectual” da Dona Bicha. Entretanto, a Bicha-Mor não deixa que esse argumento prospere: “Se até os anões podem aumentar sua estatura, graças a tratamentos médicos e o negro Michel Jackson [pôde] virar branco, nada impede que um ser humano mude sua orientação sexual.

A Bicha-Mor diz mais:

Segundo abalizadas pesquisas sexológicas, não há um determinismo insuperável que impeça qualquer indivíduo mudar o objeto de seu desejo erótico. Portanto, tanto pesquisas científicas quanto minha própria experiência convivendo com milhares de homossexuais, confirmam que existem, sim, ex-homossexuais, como existem, igualmente, exheterossexuais.

A Bicha-Mor faz questão de ressaltar que, além da própria experiência, sua atuação à frente do GBB, convivendo com “milhares de homossexuais, por mais de 30 anos seguidos” demonstra que “há casos documentados e conhecidos de rapazes que, após muitos anos praticando o homoerotismo, mudaram radicalmente de vida: optaram exclusivamente pela heterossexualidade.”

Determinada a refutar opiniões como aquela da Dona Bicha acerca dos ex-gays, a Bicha-Mor afirma “não passar de mito a ideia de que o caminho da homossexualidade não tem retorno.”

Recorrendo às informações coletadas em suas pesquisas para confirmar sua tese de que existem ex-gays, a Bicha-Mor é categórica:

Estes dados comprovam que, para muitos, o homoerotismo foi uma experiência da juventude, eventualmente uma aventura mal sucedida, em busca dos prazeres da carne, e que foi abandonada depois de encontrarem maior satisfação na repetição de experiências com o sexo oposto.

Após discorrer exaustivamente sobre a polêmica acerca da reorientação sexual, a Bicha-Mor encerra a questão nos seguintes termos:

Concluindo: ensinam a experiência e as pesquisas científicas que ninguém está inexoravelmente preso a um destino sexual – havendo inúmeros casos documentados e podendo qualquer um experimentar novas performances eróticas, e abandoná-las ou persistir naquelas que produzem maior prazer, desde que consiga liberar-se dos preconceitos individuais e enfrentar a caretice social dominada pela ideologia heterossexista.

Ex-gay, ex-lésbica, ex-travesti e até ex-transexual existem sim […] No mundo do sexo e do amor, não há limites, regras fixas, dogmatismo nem caminho de mão única: comer, amar e transar, basta começar…

Considerando que a Dona Bicha não dispõe de argumentos cientificamente validados nem possui a formação acadêmica ou a experiência de militância da Bicha-Mor, somos obrigados a reconhecer que o placar está assim: Bicha-Mor 24 x 0 Dona Bicha!

*Mestre em Saúde Pública (Fiocruz), Especialista em Políticas Públicas (UFG) e autor do livro Homossexualidade Masculina: Escolha ou Destino? (Editora Thesaurus, 2008). Contato: [email protected]